Anorexia em gatos: um sinal clínico comum e inespecífico

Anorexia em gatos: um sinal clínico comum e inespecífico

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É comum que Médicos-Veterinários recebam relatos de tutores sobre gatos sem apetite, mas existem diversas causas e estratégias nutricionais a serem exploradas para o paciente com anorexia

Um dos sinais clínicos mais comuns em gatos é a diminuição ou falta total do apetite, quadros de hiporexia e anorexia. Diante disso, a conduta do tutor varia. Por exemplo, em alguns casos quando o gato passa um dia sem se alimentar, os tutores já procuram o Médico-Veterinário. Outros, levam dias para perceber e dar importância à ausência de alimentação do seu animal.

Dessa forma, a apresentação clínica do gato com essas questões alimentares no atendimento tende a ser muito distinta, assim como a gravidade do quadro que pode ser desde ausência de achados clínicos até uma perda de peso significativa.

Portanto, vale atenção redobrada com o paciente. Neste artigo, vamos abordar os detalhes da anorexia e formas de manejo dos felinos.

Hiporexia x anorexia

Existem importantes diferenças entre a anorexia e a hiporexia (DUDDY, s.d.).

  • Anorexia: é definida pela falta de interesse pela comida ou pela perda total do apetite. Ou seja, o animal interrompe completamente sua alimentação por período prolongado.
  • Hiporexia: o termo é usado para descrever a redução do apetite ou do interesse pela comida. Ou seja, o animal se alimenta, mas a quantidade de alimento e a frequência alimentar são menores do que o costume.

É extremamente importante que, durante a anamnese, o Médico-Veterinário consiga diferenciar ambos os quadros mediante as informações concedidas pelos tutores, uma vez que quadros de anorexia podem trazer problemas sérios a curto prazo, como a lipidose hepática.

Tipos de anorexia em felinos

A anorexia possui diferentes causas, podendo ser classificada em primária e secundária, como veremos a seguir.

Anorexia primária: falta de apetite

O principal sinal clínico da anorexia primária é a falta total de apetite do felino, podendo gerar alterações dos tipos (DUDDY, s.d.):

  • neurológica: alterações primárias no sistema nervoso central, relacionadas de forma direta ao centro do apetite, no hipotálamo. As causas podem ser por lesões traumáticas, neoplasias ou outras doenças;
  • anosmia: ausência ou redução de olfato. Ou seja, o felino é incapaz de sentir o cheiro do alimento e, com isso, o interesse pela comida diminui;
  • comportamental: devido às mudanças ambientais ou inadequações do espaço em que o gato vive, manejo alimentar inadequado ou alterações súbitas na dieta, medo ou ansiedade, níveis elevados de estresse, entre outros.

Anorexia secundária: qualquer distúrbio que altere o apetite

Entre as principais causas da anorexia secundária estão (DUDDY, s.d.):

  • dor: infecções, abscessos, traumas, artrites, doenças odontológicas, neoplasias e outras doenças/alterações;
  • neoplasias: dependendo da localização e estágio da doença pode causar hiporexia ou anorexia;
  • fármacos: muitos fármacos podem reduzir o apetite, diminuindo o interesse do animal pela comida.

A anorexia secundária é o tipo mais comum na clínica veterinária e, geralmente, ocorre de forma secundária a uma doença de base. Nesses casos, a anorexia se manifesta entre um dos sinais clínicos e é considerada a forma mais comum de anorexia felina.

Entre as afecções que podem causar o problema, as mais comuns são (DUDDY, s.d.):

  • infecções, que podem gerar febre e desidratação;
  • pielonefrite, doença renal crônica, pancreatite, hepatopatias e outras enfermidades que possam gerar náuseas;
  • problemas no trato respiratório superior, que geram a redução do olfato;
  • doenças osteoarticulares, que geram dor;
  • tríade felina, que gera náusea e dor;
  • gastrites e enterites;
  • corpo estranho;
  • neoplasias;
  • doenças infecciosas como as retroviroses (FIV, FeLV e outras);
  • endocrinopatias;
  • anemias;
  • intoxicações.

A utilização de quimioterápicos pode gerar náuseas no animal, já certos fármacos podem reduzir o apetite. Os opióides, por exemplo, são medicamentos que agem no sistema nervoso central aliviando a dor e podem ser utilizados de forma individual ou associados com outros medicamentos não-opioides. Eles inibem a via orexigênica, que possui a função de estimular o apetite (DUDDY, s.d.).

Como identificar anorexia em gatos

Nos atendimentos veterinários, é comum que o tutor relate que o felino tem apresentado a redução do apetite ou a falta de interesse parcial ou total pelo alimento. Entretanto, essa manifestação é um sinal clínico que pode estar associado a diversas outras doenças.

É essencial que o tutor esteja atento para observar todas as mudanças de comportamento e hábitos do animal, como a quantidade de horas que o animal não se alimenta, se o animal reduziu o tipo de alimento ou a quantidade e a frequência alimentar ou ainda se a interrompeu por completo.

O tutor e Médico-Veterinário também podem perceber se o gato sem apetite apresenta:

Essas informações são essenciais para que o Médico-Veterinário faça uma minuciosa anamnese e solicite os exames laboratoriais e de imagem necessários para o caso. Assim será possível identificar e controlar a(s) doença(s) que acometem o pet que está manifestando a anorexia ou a hiporexia como sinal clínico.

Diversas doenças e até mesmo a lipidose hepática, também conhecida como “fígado gorduroso”, podem se manifestar agravando o caso. No caso da lipidose hepática, trata-se de uma síndrome caracterizada pelo acúmulo excessivo de triglicerídeos no fígado e em felinos domésticos é associada a longos períodos de jejum (acima de 12 horas). Geralmente animais em sobrepeso ou obesos tendem a apresentar o problema com maior frequência, uma vez que possuem quantidade maior de gordura estocada. Caso não seja tratada com urgência, a lipidose pode levar o pet a óbito.

Pseudoanorexia: quando o animal não pode se alimentar por diversas razões

Na anorexia, como vimos, o animal não se alimenta devido à perda do apetite e do interesse pelo alimento. Já na pseudoanorexia, o animal apresenta fome, mas pode estar relutante para se alimentar ou ser incapaz de realizar a preensão do alimento por algum motivo. Além das doenças já citadas, outras possíveis causas envolvem:

  • alterações neurológicas, como paralisia de nervo hipoglosso ou trigeminal;
  • mudanças abruptas na alimentação ou alimento de baixa palatabilidade;
  • mudanças ambientais, como por exemplo o comedouro posicionado em local que não traga segurança e conforto ao gato no momento de se alimentar e/ou em local que o gato não tem fácil acesso;
  • estresse provocado por mudanças na rotina do animal, brigas, introdução ou adaptação de um novo gato na casa e outros.

A anamnese deve ser minuciosa, contudo, muitas vezes o tutor não consegue ter certeza do tempo da perda de apetite e nem mesmo se trata de uma hiporexia ou anorexia. O exame clínico deve ser realizado em busca de anormalidades evidentes que possam justificar a perda de apetite. Alterações bucais e/ou gastrointestinais podem, não raramente, serem a causa da hipo ou anorexia. Portanto, a avaliação da cavidade oral durante a consulta é sempre imprescindível!

Alguns exames laboratoriais complementares podem auxiliar no diagnóstico, como hemograma, urinálise e perfil renal e hepático. O conjunto de exames geralmente é usado também em momentos de check-up, visando avaliar o estado geral do animal. Alguns gatos anoréxicos podem apresentar hipocalemia, o que aumenta a letargia e contribui para a piora da diminuição do apetite (DUDDY, s.d.).

O rápido diagnóstico e a correção da causa primária são indicativos de um bom prognóstico. Porém, enquanto as investigações clínicas estão sendo realizadas é importante o início imediato do suporte nutricional, que auxiliará a acelerar a recuperação do gato e diminuir a morbidade e a mortalidade (BRUNETTO, 2006).

O desequilíbrio eletrolítico e a desidratação também são frequentes em casos de perda de apetite. Portanto, deve-se corrigir desequilíbrios hidroeletrolíticos por meio de fluidoterapia. Não menos importante que garantir suporte nutricional e hidroeletrolítico é a avaliação da dor. Caso o gato apresente sinais de dor ou desconforto detectados no exame clínico ou pela utilização de escalas para avaliação da dor em gatos, um protocolo de analgesia também deverá ser iniciado (BRUNETTO, 2006).

Alimentação para gatos com anorexia

Sempre que possível, deve-se realizar a alimentação convencional (por via oral) ou assistida. Isso porque, dessa forma, a probabilidade de translocação bacteriana é reduzida e a atrofia dos enterócitos também, uma vez que o trato grastrointestinal estará em constante funcionamento. Diante disso, a nutrição microenteral ou enteral é preferível à nutrição parenteral. Os enterócitos obtêm a metade de seus nutrientes diretamente do lúmen intestinal. Essas células tornam-se hipoplásicas e hipofuncionais em gatos anoréxicos, com permeabilidade aumentada (BRUNETTO, 2006).

Desta forma, a primeira tentativa é a alimentação voluntária, oferecendo um alimento com elevada densidade energética para que o volume seja reduzido, porém, atendendo às necessidades do animal. A alimentação completa ou coadjuvante úmida é uma grande aliada nesse momento devido à alta palatabilidade (BRUNETTO, 2006). Caso o gato não aceite o alimento voluntariamente, outras opções de estratégias nutricionais devem ser avaliadas, como a alimentação assistida.

Alimentação Assistida

A alimentação assistida é realizada com o auxílio de tubos ou sondas que permitirão a administração de alimento, auxiliando na manutenção das funções do TGI do gato. Há diversas vias de administração com vantagens e desvantagens relacionadas a cada uma delas. O estado geral do paciente, a cooperação do tutor e a experiência do Médico-Veterinário serão fatores decisivos na escolha da técnica, sendo os mais comuns (DUDDY, s.d.):

  • Sondagem nasoesofágica: torna o momento da alimentação menos estressante, podendo ser realizada com ou sem sedação. O procedimento geralmente possui baixo custo e é muito rápido, além de proporcionar ao tutor facilidade na hora da alimentação. Entretanto, o pequeno calibre da sonda permite apenas a administração de dietas líquidas que garantam o suprimento nutricional necessário. Além disso, a sonda nasoesofágica pode ser mantida no animal por, no máximo, 1 semana e a higienização correta do tubo é indispensável.
  • Sonda esofágica/Esofagostomia: permite a administração a longo prazo de um alimento de consistência mais espessa. O animal consegue comer e beber água voluntariamente com essa sonda. A colocação requer sedação, porém nem sempre é possível devido à gravidade do estado geral que o animal possa estar. A higienização da sonda após as alimentações é essencial.
  • Sonda gástrica/Gastrostomia: permite alimentação em longo prazo com alimentos úmidos. A sedação é requerida para a colocação do tubo e a higienização após a alimentação é indispensável.

A partir do momento em que o animal começar a se alimentar voluntariamente, na quantidade adequada e suficiente para a manutenção do peso saudável, a alimentação assistida poderá ser descontinuada. Entretanto, o acompanhamento veterinário deve continuar enquanto for necessário, de acordo com cada caso.

A anorexia associada à ausência de infusão de calorias no enfermo dá lugar às alterações importantes na estrutura e funções intestinais, aumento da resposta inflamatória e morbidade infecciosa. O suporte nutricional é uma prática mandatória para esses pacientes e tem como finalidade além de estimular e manter as funções do TGI, nutrindo adequadamente o paciente.

A ROYAL CANIN® possui alimentos coadjuvantes secos e úmidos, que graças ao seu perfil nutricional ideal ajudam muito em quadros de anorexia. Durante o período de internação do paciente em anorexia ou hiporexia, o alimento úmido Recovery® pode ser uma excelente escolha, pois oferece excelente palatabilidade, além de altos índices energéticos.

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Referências bibliográficas

BRUNETTO, Mácio Antonio. Avaliação de Suporte Nutricional Sobre a Alta Hospitalar em Cães e Gatos. Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias – UNESP, Jaboticabal, 2006. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/89238. Acesso em: 23 mai. 2022.

DUDDY, Jean. MSPCA-Angell. Approach to the anorexic cat. Disponível em: https://www.mspca.org/angell_services/approach-to-the-anorexic-cat/. Acesso em: 23 mai. 2022.

PDSA. My cat isn’t eating. Disponível em: https://www.pdsa.org.uk/taking-care-of-your-pet/pet-health-hub/symptoms/my-cats-not-eating. Acesso em: 23 mai. 2022.