Rinotraqueíte felina: agentes causadores, sinais clínicos e manejo do paciente

Rinotraqueíte felina: agentes causadores, sinais clínicos e manejo do paciente

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A rinotraqueíte felina é uma grave enfermidade, que pode trazer diversas complicações para a vida do gato. Por ser complexa, o seu diagnóstico é um desafio ao Médico-Veterinário, mas existem formas eficazes de prevenção, além do manejo adequado e tratamento que podem prevenir a reativação viral; saiba mais

O vírus FHV-1 é o agente causador da rinotraqueíte felina, uma infecção respiratória de distribuição mundial, também conhecida popularmente como “gripe felina”. A doença afeta os olhos e o complexo respiratório dos gatos durante todo o ano, especialmente no inverno.

A enfermidade se manifesta de forma sintomática ou assintomática, eliminando os agentes patogênicos de forma contínua ou descontínua no ambiente, sendo capaz de disseminar o vírus até mesmo nos períodos latentes da doença.

A transmissão ocorre por meio do contato do animal saudável com um infectado ou com suas secreções, como espirros e saliva, mas também pode ocorrer de forma indireta, como por meio de fômites.

Os felinos de todas as raças e idades estão susceptíveis a contaminação do FHV-1, principalmente os filhotes e animais imunossuprimidos, que podem acabar desenvolvendo a forma mais grave da doença, devido a fragilidade do sistema imunológico.

Veremos a seguir mais detalhes sobre a rinotraqueíte felina, formas de prevenção e tratamentos.

Agente causador da rinotraqueíte felina

A rinotraqueíte viral felina é causada pelo agente etiológico FHV-1, um vírus envelopado de dupla fita de DNA, tendo também outras cepas virais (ORZIA, 2021). Esse vírus é pertencente à família Herpesviridae.

A afecção é comum na rotina da clínica veterinária de felinos, pois acomete os gatos domésticos e outras espécies de felinos, provocando a infecção aguda e severa no trato respiratório superior e sistema ocular dos seus hospedeiros. Estudos mostram que a prevalência de FHV-1 pode chegar a 63% dos casos de infecções respiratórias nos gatos (ROCHA, 2021).

Os sinais clínicos são similares aos de outras afecções que são causadas por agentes distintos, como a calicivirose, micoplasmose e a clamidiose felina. A ausência de sinais patognomônicos faz com que o profissional inclua outras suspeitas diagnósticas em sua avaliação.

Outros Agentes

Diversos agentes podem causar as doenças do trato respiratório superior no felino, sendo os principais:

  • Calicivírus felino (FCV): este agente causa a calicivirose, apresentando sinais clínicos semelhantes a rinotraqueíte viral felina. Porém, além dos agentes causadores serem distintos, as úlceras na cavidade oral e região de face são mais frequentes nos casos de calicivirose. Neste caso, é importante realizar o diagnóstico diferencial com outras patologias, como o complexo gengivoestomatite felina.
  • Chlamydophila felis: é uma bactéria gram-negativa, parasita intracelular obrigatório, com predileção por epitélio conjuntival, podendo também se replicar no epitélio respiratório, no gastrointestinal e no geniturinário. Esse agente causa a clamidiose felina. Os sinais clínicos são similares à rinotraqueíte viral felina e à calicivirose. Porém, além dos agentes causadores serem distintos, as conjuntivites são mais frequentes nesses casos.

Essas enfermidades e outras podem ser confundidas com a rinotraqueíte felina, mas a diferenciação é fundamental para oferecer ao paciente as melhores opções de tratamento e, consequentemente, tornar o prognóstico mais favorável.

Como os gatos são acometidos pela doença

O período de maior incidência é no inverno, onde a transmissão ocorre a partir do contato direto de secreções nasais, orais e oculares dos felinos acometidos pela afecção com outros gatos. A transmissão também pode ocorrer de forma indireta, por meio de fômites ou em locais como gatis, onde há superpopulação de animais (CAMARGO, 2021).

Após infectado, o animal com rinotraqueíte felina, torna-se portador do agente durante toda a sua vida. Mas a afecção possui períodos de latência, em que o vírus fica inativo no organismo. Entretanto, mesmo em período latente, pode haver a transmissão do vírus (CAMARGO, 2021).

O vírus também pode ficar alojado em objetos no ambiente e infectar outros animais, mas a sua vida fora do hospedeiro é muito curta, podendo durar apenas poucas horas.

Os felinos de todas as idades e raças podem ser acometidos, mas a enfermidade é mais comum nos gatos que não são esterilizados, nas gatas prenhes, nos animais que estão debilitados ou imunossuprimidos e também nos filhotes, por possuírem um sistema imunológico frágil (CAMARGO, 2021).

Fases da rinotraqueíte

A enfermidade se manifesta de formas distintas, de acordo com as fases descritas abaixo.

  • Fase de incubação: ocorre entre 2 e 5 dias após a infecção pelo vírus.
  • Fase aguda: o vírus se multiplica, principalmente nas células mucoepiteliais de tonsilas, tecido conjuntivo, linfonodos mandibulares, mucosa nasal do septo e conchas, nasofaringe, traquéia superior e também nas células epiteliais da córnea ocular e conjuntiva (ROCHA, 2021). A fase dura entre 2 e 3 semanas aproximadamente.
  • Fase de latência: o indivíduo pode passar meses ou anos da sua vida na fase latente. Mas, o período varia de acordo com diversos fatores, como a idade do animal, a exposição a doenças secundárias e a utilização de imunossupressores. Nesta fase, o indivíduo pode não apresentar sinais clínicos.
  • Fase de reativação viral: o ressurgimento da afecção ocorre com a reativação viral, podendo suceder de forma espontânea ou estar associado a situações de estresse (ROCHA, 2021), como alterações alimentares bruscas ou ambientais, presença de dores ou desconfortos, introdução e adaptação de um novo animal no mesmo ambiente e outros.

Sinais clínicos da doença nos felinos

Os sinais clínicos podem ter variações de acordo com a exposição viral, susceptibilidade de cada animal e fases da doença (ROCHA, 2021). Além disso, outras infecções oportunistas secundárias recorrentes ou crônicas podem surgir devido a imunossupressão, podendo tornar o animal mais suscetível ao adoecimento e com maior dificuldade de recuperação.

As manifestações clínicas mais frequentemente observadas nesses casos são (ROCHA, 2021):

  • espirros;
  • secreções oculares e nasais, podendo variar de transparentes à mucopurulentas;
  • dispneia;
  • febre;
  • letargia;
  • inapetência;
  • rinotraqueíte aguda;
  • necrose focal;
  • acometimentos oculares, como ceratite epitelial, conjuntivite aguda e ulcerações na córnea;
  • lesões macroscópicas, como necrose dos epitélios da cavidade nasal, epiglote, faringe, laringe, traqueia e tonsilas;
  • broncopneumonia e pneumonia intersticial;
  • acúmulo de células inflamatórias e exsudato fibrinoso nos alvéolos;
  • inclusões intranucleares nas células epiteliais, podendo ser visualizadas microscópicamente.

O acompanhamento clínico especializado se faz necessário em todas as fases da doença para evitar que ocorra o agravamento do quadro e, até mesmo, o óbito do animal.

Diagnóstico da rinotraqueíte felina

O diagnóstico é imprescindível para que o Médico-Veterinário identifique qual é a melhor opção para tratamento, inclusive visando evitar o surgimento de doenças secundárias, principalmente nos momentos em que o animal apresente imunossupressão ou agravamento dos sinais clínicos.

Para diagnosticar, geralmente o Médico-Veterinário realiza uma minuciosa anamnese para verificar todo o histórico e, então, poder identificar quais são os sinais clínicos apresentados pelo animal, como se há a presença de secreções oculares, nasais ou da mucosa oral do felino e etc.

O profissional também pode solicitar outros exames complementares para diagnóstico diferencial, como PCR ou outros, conforme a individualidade do caso.

Tratamento da rinotraqueíte

Embora não haja tratamento 100% específico para o combate da rinotraqueíte felina, geralmente é realizado tratamento de suporte e sintomático adequado para cada caso. Outros tratamentos também podem ser indicados para evitar possíveis agravamentos no quadro, por exemplo, a cegueira devido às severas lesões oculares.

O uso de fármacos pode ser indicado para o manejo clínico dependendo de cada caso, sendo muito importante que o Médico-Veterinário avalie o paciente de forma individual, pois o animal pode ter alguma restrição ou particularidade que o impeça de receber certos tipos de medicamentos.

No caso da presença de sinais clínicos, podem ser associados os tratamentos sintomáticos, como incluir analgésicos sistêmicos para tratar a dor, além de anti-inflamatórios não esteroidais (AINES), e antibióticos caso seja identificada alguma infecção bacteriana secundária no caso.

A importância da terapia de suporte

A terapia de suporte, como a fluidoterapia, pode ser indicada para melhorar a volemia através da reposição de fluídos, além de corrigir os desequilíbrios hidroeletrolíticos e repor vitaminas e minerais.

Sabe-se que a reativação viral pode ocorrer quando o felino vivencia situações de estresse, mas a utilização de feromônios sintéticos pode auxiliar na modificação do estado emocional do felino, reduzindo quadros de ansiedade e estresse.

O animal também pode apresentar inapetência e emagrecimento como sinais clínicos, portanto é imprescindível oferecer ao felino alimentos nutritivos, visando a prevenção para o surgimento de doenças secundárias, manutenção e melhora do estado de saúde do paciente.

Os alimentos úmidos podem ser uma excelente opção, principalmente nos momentos em que os gatos estiverem debilitados ou internados, já que possuem uma quantidade elevada de água promovendo o aumento da hidratação hídrica e manutenção do trato urinário do felino, além de possuir excelente palatabilidade.

O alimento Recovery ROYAL CANIN® é uma excelente opção para esses casos, já que auxilia na oferta de calorias e nutrientes, além de conter quantidade satisfatória de líquido em sua composição, auxiliando também na reidratação do animal. Sua alta palatabilidade proporciona maior sucesso na alimentação de gatos enfermos. Utilize a ferramenta gratuita Calculadora para Prescrições para auxiliar na recomendação.

Tempo para recuperação do paciente

Por ser uma enfermidade com potencial de latência e crônica, com possibilidade de reativação, a recuperação em casos de fases aguda e de reativação viral podem durar entre 2 e 3 semanas até entrar em período latente novamente.

O uso de medicamentos e da terapia de suporte podem ser indicados de acordo com cada caso, mas por não haver tratamento disponível que seja 100% eficaz no combate do vírus, a prevenção é imprescindível.

Os tutores devem ser orientados para garantir que os filhotes e animais adultos sejam vacinados, já que a vacina V4 oferece proteção para a rinotraqueíte felina e outras doenças. O protocolo vacinal deve ser devidamente seguido conforme recomendação do Médico-veterinário.

Prognóstico da rinotraqueíte felina

O prognóstico para a rinotraqueíte depende do estado geral do felino, mas geralmente é favorável, principalmente quando a replicação viral é tratada antes mesmo do período de latência do vírus nos gânglios sensoriais, evitando possíveis novas manifestações da viremia (ORZIA, 2021).

Os filhotes podem ter complicações mais graves, já que ainda estão desenvolvendo o sistema imunológico, principalmente se estiverem desnutridos ou muito debilitados.

Prevenção da gripe felina

As vacinas V3, V4 e V5 oferecem proteção para a rinotraqueíte felina e outras afecções, sendo fontes eficazes de prevenção e fortalecendo o sistema imunológico do pet contra a afecção. Mas, é essencial que o Médico-Veterinário avalie qual é a melhor forma de imunização para o paciente de acordo com as condições gerais de saúde e outros aspectos e alerte o tutor sobre a importância da vacinação do animal.

As vacinas devem ser armazenadas corretamente para não ocorrer interferências em sua capacidade de soroconversão.

Além disso, não é recomendado que o gato tenha livre acesso à rua ou contato com outros animais não testados. A esterilização dos felinos também pode auxiliar, já que reduz a ocorrência de fugas.

Também é muito importante oferecer alimentos com formulações de acordo com as particularidades nutricionais dos felinos para fornecer nutrição sob medida, conforme as necessidades específicas de cada animal. A alimentação adequada também auxilia no fortalecimento do sistema imunológico, dá suporte ao crescimento saudável de filhotes e contribui para a manutenção geral da saúde do pet.

Quando vacinar o gato

Somente o Médico-Veterinário pode administrar e aplicar as vacinas nos animais. Todas as vacinas devem ter boa procedência, além de armazenamento e manipulação adequados, possibilitando que o felino fique imune a diversas doenças, como a raiva, panleucopenia, rinotraqueíte, calicivirose e clamidiose (Stone et al, 2020).

Além disso, é essencial que o profissional alerte o tutor sobre a importância de imunizar o gato no período adequado (Stone et al, 2020).

  • V4: a vacinação deve ser realizada seguindo protocolos de guidelines de vacinação de gatos atuais e, se possível, o protocolo deverá iniciar ainda na fase de filhote.
  • Antirrábica: deve ser aplicada por volta dos 4 meses, após a finalização do protocolo da V4. É muito importante reforçar o tutor sobre a importância de todas as vacinas e, no caso da raiva, reforçar a informação de que se trata de uma importante zoonose, da qual há relatos de casos em humanos nos últimos anos, sendo imprescindível a vacinação dos animais domésticos.

Entretanto, em alguns casos a vacinação não é indicada, pois pode causar um agravamento no quadro clínico do animal ou em animais com histórico de reações como choque anafilático. O Médico-Veterinário deve avaliar individualmente o paciente para recomendar ou não a vacinação.

Referências bibliográficas

STONE, Amy. et al. 2020 AAHA/AAFP Feline Vaccination Guidelines. JAAHA.ORG, v. 56, p. 249-265, 2020. Disponível em: https://www.aaha.org/globalassets/02-guidelines/feline-vaccination-guidlines/resource-center/2020-aahaa-afp-feline-vaccination-guidelines.pdf. Acesso em: 15 jul. 2022.

CAMARGO, Rayana Pereira. Rinotraqueíte viral felina seguida de broncopneumonia secundária. 2021, p. 14-29. Dissertação (UCP) – Bacharel em Medicina Veterinária – Faculdade do Centro do Paraná, Paraná, 2021. Disponível em: http://repositorio.ucpparana.edu.br/index.php/medvet/article/view/134. Acesso em: 15 jul. 2022.

ORZIA, Pedro Augusto Andrade Sousa. Principais patógenos do complexo respiratório felino. 2021, p. 10-24. Dissertação (Faculdade Metropolitana de Anápolis) – Bacharel em Medicina Veterinária – Faculdade Metropolitana de Anápolis, Goiás, 2021. Disponível em: https://repositorio.faculdadefama.edu.br/xmlui/handle/123456789/71. Acesso em: 15 jul. 2022.

ROCHA, Mariana Gonçalves. Protocolo terapêutico do herpesvírus felino 1 – revisão de literatura. 2021, p. 8-26. Dissertação (CEUB) – Bacharel em Medicina Veterinária – Centro de Ensino Unificado de Brasília, Brasília, 2021. Disponível em: https://repositorio.uniceub.br/jspui/bitstream/prefix/15619/1/21753033.pdf. Acesso em: 15 jul. 2022.