Fenda palatina em cães e gatos: principais aspectos

Fenda palatina em cães e gatos: principais aspectos

Links rápidos:

A fenda palatina em cães e gatos pode representar sérios riscos à saúde do pet; saiba mais sobre os sinais clínicos, diagnóstico, intervenção cirúrgica e manejo nutricional nesses casos

Os palatos mole e duro estão localizados na porção dorsal da cavidade oral, separando as cavidades orofaríngea e nasal. Ambos pertencem ao sistema estomatognático e exercem funções primordiais, que possibilitam a respiração, a sucção, a mastigação, a deglutição e a fonação.

A fenda palatina em cães e gatos também é conhecida como palatosquise, sendo mais frequente em cães. A afecção é considerada uma malformação congênita do desenvolvimento fetal, podendo também pode ser secundária a traumas, como veremos adiante neste artigo.

Um estudo realizado com 178 ninhadas caninas e o total de 803 neonatos identificou uma incidência de 6,7% (64/803) de neonatos com diferentes malformações congênitas (PEREIRA et al, 2019).

A fenda palatina pode representar grandes riscos à vida do pet em virtude da possibilidade de complicações, como a pneumonia aspirativa. Com isso, fica claramente evidenciado que o diagnóstico precoce favorece a instituição do tratamento adequado, visando um melhor prognóstico para o paciente.

Veremos a seguir as principais causas, formas de tratamentos e recomendações aos tutores.

O que é fenda palatina

Durante o desenvolvimento estrutural e funcional da cabeça do feto do animal, em alguns casos o fechamento de certos tecidos e ossos não ocorre de forma adequada, desencadeando aberturas primárias ou secundárias na cavidade bucal que deve ser identificada precocemente nos neonatos (CASTELETI, 2022).

Nesses casos, há uma disfunção do palato, gerando uma comunicação direta entre as cavidades oral e nasal por meio da fenda aberta, que pode estar associada ou não a existência de uma fenda labial, também conhecida como “lábio leporino” ou queilosquise.

Quando a fenda palatina acomete apenas o palato duro ou o palato mole é considerada como parcial, mas quando se manifesta em ambos, é classificada como completa (CASTELETI, 2022).

A condição pode ter causa congênita ou adquirida, como veremos a seguir.

Fenda palatina congênita

Animais de diversas raças podem nascer com malformações congênitas, mas os cães de raças braquicefálicas possuem maior predisposição à fenda palatina congênita. Dentre eles, podemos citar (CASTELETI, 2022):

  • Bulldog Francês;
  • Pug;
  • Boston Terrier;
  • Pequinês;
  • Boxer;
  • Bulldog;
  • Shih Tzu.

Esses animais apresentam risco 30% superior às demais raças descritas, como Pastor Alemão, Labrador Retriever, Cocker Spaniel, Beagle, Teckel, Shetland, Sheepdog e Schnauzer. Além disso, fêmeas podem ser mais predispostas. Para completar, cerca de 8% dos animais acometidos também podem apresentar outras malformações (CASTELETI, 2022).

Na espécie felina, a raça siamesa é considerada como uma das mais acometidas (CASTELETI, 2022).

Além da predisposição racial e demais fatores já citados, há outros que podem contribuir para o surgimento da fenda palatina congênita (CASTELETI, 2022):

  • hereditariedade, consanguinidade e idade avançada dos progenitores (esses animais não devem ser utilizados para fins reprodutivos);
  • dietas desbalanceadas durante o período gestacional, com deficiências de vitaminas B2, B6 e ácido fólico ou excesso de vitamina A e D;
  • exposição à radiação ionizante;
  • toxoplasmose;
  • hipertermia;
  • excesso de estresse;
  • desregulação hormonal;
  • ingestão de agentes químicos, entre eles pesticidas, herbicidas, resíduos de solventes e metais;
  • ingestão de plantas tóxicas e substâncias teratogênicas;
  • administração de determinados medicamentos não recomendados para cadelas e gatas em período gestacional possuem potencial teratogênico, como antibióticos (penicilinas, ampicilina e tetraciclina), anti-inflamatórios não esteroidais (diclofenaco sódico e potássico), antifúngicos (nistatina) e broncodilatadores (salbutamol o fenoterol);
  • interferência mecânica com o embrião em desenvolvimento.

Nos cães, o período gestacional mais crítico ocorre entre o 25º e o 28º dia, pois é neste período que o palato fetal está se desenvolvendo e fechando (CASTELETI, 2022).

É recomendado que o Médico-Veterinário leia a bula e conheça os riscos de todos os medicamentos prescritos para cadelas prenhes, visando evitar problemas relacionados a malformações congênitas, distocias, abortamentos, entre outras complicações.

Saiba mais detalhes sobre o manejo e a nutrição da cadela durante a gestação.

Principais formas de prevenção

Alguns cuidados podem ser tomados como forma de prevenção da fenda palatina congênita, visando a diminuição no número de casos, como:

  • fornecer alimento de excelente qualidade para a cadela/gata desde o início da prenhez, tendo como objetivos manter a saúde da mãe e proporcionar um desenvolvimento saudável aos filhotes. Para os felinos, por exemplo, o alimento Mother & Babycat é a opção ideal para ser oferecido para a gata prenhe desde o início da gestação;
  • avaliar a suplementação de cadelas prenhes com ácido fólico (Vitamina B9). Quando associados à vitamina B12, os folatos contribuem para a síntese de ácidos nucleicos, divisão celular e metabolismo de alguns aminoácidos;
  • evitar a reprodução de animais que nasceram com o problema;
  • realizar o acompanhamento com o Médico-Veterinário durante todo o período gestacional, visando avaliar a evolução da prenhez, realizar ajustes de dieta e de manejos, entre outros cuidados.

Fenda palatina adquirida ou traumática

A fenda palatina em cães e gatos pode ser adquirida por diversos fatores, como (MACÁRIO et al, 2020):

  • traumas cranianos, como acidentes, atropelamentos e brigas com outros animais;
  • presença de corpo estranho, geralmente objetos perfurocortantes;
  • tumores orais que resultam em desunião da sutura intermaxilar e no rompimento da mucosa palatina.

Fenda palatina x lábio leporino

Embora o lábio leporino e a fenda palatina sejam problemas congênitos que derivam da mesma célula embrionária e, portanto, possuem íntima relação (CASTELETI, 2022), existem diferenças importantes que devem ser consideradas para um diagnóstico e tratamento adequados.

  • Lábio leporino: neste caso, a fissura ocorre no lábio superior. É diagnosticado com maior facilidade em virtude de sua localização e pode não haver alterações funcionais importantes. Geralmente a correção cirúrgica é indicada por questões estéticas, ou em casos de fissuras maiores para evitar a aspiração de secreções e alimentos pelas narinas.
  • Fenda palatina: a fissura acomete o palato duro, mole ou ambos e afeta suas estruturas e funcionalidades, criando uma conexão direta com estruturas do sistema respiratório superior. Casos congênitos podem ser subdiagnosticados em virtude da falta de inspeção ou inspeção inadequada da cavidade oral dos neonatos, representando um risco à vida do animal.

Tanto o lábio leporino como a fenda palatina podem acometer concomitantemente o mesmo animal, sendo mais frequente em cães do que em gatos (CASTELETI, 2022).

Sinais clínicos de fenda palatina ou palatosquise em cães e gatos

Os sinais clínicos da palatosquise ou fenda palatina em animais domésticos podem variar conforme a intensidade da afecção, a localização e a gravidade das fissuras.

Além disso, pode haver complicações devido à passagem de substâncias e microrganismos da cavidade oral para as vias áreas e o pulmão dos neonatos que ainda não possuem o sistema imunológico totalmente desenvolvido e fortalecido ou animais adultos acometidos pela forma adquirida da afecção. As complicações mais comuns envolvem o surgimento de problemas respiratórios como rinite, sinusite e pneumonia aspirativa (MACÁRIO et al, 2020).

Conheça os principais aspectos da pneumonia aspirativa

Além das complicações citadas, os neonatos que possuem a fenda palatina podem ter maior dificuldade para criar a pressão negativa necessária durante a amamentação. Essa incapacidade de sucção adequada pode resultar em subnutrição do animal e maior dificuldade em ganhar peso (CASTELETI, 2022), caquexia e até mesmo a morte por inanição (MACÁRIO et al, 2020).

Os animais acometidos também podem ter a presença de leite materno, alimentos e secreções extravasando pelas narinas, engasgos durante a deglutição (inclusive na amamentação) e outros, como (CASTELETI, 2022):

  • descarga nasal serosa a mucopurulenta;
  • náuseas;
  • aerofagia;
  • espirros;
  • tosses;
  • salivação em excesso;
  • traqueíte;
  • dispneia;
  • alterações dentárias (forma, tamanho, posição, desenvolvimento e número de dentes).

Na primeira consulta veterinária é primordial que seja feita a inspeção da cavidade oral dos filhotes e recém-nascidos a fim de identificar se há fissuras na estrutura labial e no palato felino e canino (CASTELETI, 2022). Além disso, em casos de partos assistidos ou cesarianas, é essencial que a cavidade oral do neonato seja avaliada pelo Médico-Veterinário, assim como todos os demais pontos que visam garantir a saúde e bem-estar do pet recém-nascido.

Diagnóstico e tratamento de fenda palatina em cães e gatos

A fenda palatina pode ser facilmente observada pelo tutor em alguns casos e o diagnóstico, confirmado pelo Médico-Veterinário. Porém, dependendo da localização e extensão da fissura, o problema pode ser identificado somente durante o exame físico da cavidade oral.

Em relação a realização de exames complementares, geralmente são solicitados como avaliação pré-anestésica para o procedimento corretivo, como por exemplo eletrocardiograma, mensuração de pressão arterial, hemograma, bioquímicos para avaliação de função renal e hepática, entre outros.

A correção cirúrgica é recomendada a partir dos 3 meses de vida do animal e é o tratamento de escolha para a maioria dos casos, visto que o paciente acometido possui dificuldade em se alimentar e há risco elevado de aspiração de alimentos para as vias respiratórias (CASTELETI, 2022).

O procedimento cirúrgico visa restaurar a estrutura do palato para retomar a anatomia funcional, fechando a comunicação entre as cavidades nasal e oral, evitando complicações no quadro (CASTELETI, 2022).

Para a realização do procedimento, o Médico-Veterinário cirurgião deve avaliar se o paciente possui condições adequadas de saúde para submetê-lo à cirurgia, bem como a exata localização e extensão da fenda, para escolher a técnica de correção cirúrgica mais adequada.

Caso haja infecções respiratórias, o protocolo do tratamento preconizado poderá incluir fluidoterapia, oxigenioterapia, antibioticoterapia, uso de broncodilatadores, entre outros. Em casos mais graves, como o de pneumonia aspirativa, pode ser recomendado realizar o escovado ou lavado traqueal para cultura e antibiograma, visando o uso responsável de antimicrobianos e, consequentemente, evitando problemas relacionados à resistência bacteriana (CASTELETI, 2022).

Manejo alimentar do pet com fenda palatina

Antes e após a correção cirúrgica, e até a recuperação do paciente, deve-se orientar os tutores sobre a necessidade de limitar o acesso do animal a objetos duros como alimentos, brinquedos e outros.

O prognóstico dependerá de cada caso, pois a fenda pode ou não ser totalmente reparada com o tratamento cirúrgico. Para alguns pacientes, múltiplas cirurgias são necessárias para um resultado final satisfatório (CASTELETI, 2022).

Até que o paciente complete a idade adequada para realização da correção cirúrgica é recomendado que o tutor forneça sucedâneos lácteos via sonda para reduzir o risco de infecções e engasgos. Caso o paciente esteja desnutrido ou caso o Médico-Veterinário avalie como necessário, poderá também ser alimentado exclusivamente por sonda esofágica (CASTELETI, 2022).

Após o procedimento cirúrgico, para facilitar a cicatrização pós-cirúrgica, além de nutrir e fortalecer o sistema imunológico do paciente visando a sua recuperação, a alimentação fornecida deve ser pastosa por 3 a 4 semanas, podendo também ser fornecida por sonda esofágica (CASTELETI, 2022).

Para suporte nutricional dos pacientes com fenda palatina que necessitem de uma alimentação pastosa, a ROYAL CANIN® oferece diversas opções de alimentos úmidos.

alimentos úmidos para filhotes da Royal Canin
Alimentos úmidos para filhotes da ROYAL CANIN®

Além disso, animais subnutridos e que necessitem de um aporte nutricional mais específico podem utilizar o alimento úmido Recovery. O produto possui a textura ideal para ser administrado inclusive via seringas, sondas ou tubos enterais, evitando lesionar o local da incisão cirúrgica. Ele também auxilia na recuperação do paciente, visto que é um alimento balanceado, com alta densidade energética (lipídios e proteínas), alto teor de vitaminas e minerais, antioxidantes, mananoligossacarídeos (MOS), fruto-oligossacarídeos (FOS), ômega 3, glutamina e arginina, oferecendo excelente suporte energético e hidratação ao paciente.

Embalagem do alimento Recovery da Royal Canin

Entretanto, vale ressaltar que até as 4 semanas de idade o filhote deve ser alimentado exclusivamente com os sucedâneos do leite.

Para verificar qual é o tipo ideal de alimento e fornecer uma indicação nutricional mais precisa e personalizada, de acordo com as necessidades individuais dos seus pacientes, acesse a nossa Calculadora para Prescrições.

Referências bibliográficas

PEREIRA, Keylla Helena Nobre Pacifico et al. Incidence of congenital malformations and impact on the mortality of neonatal canines. Theriogenology, Botucatu, v. 140, p. 52-57, 2019. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0093691X19303371?casa_tok#!. Acesso em: 12 set. 2022.

MACÁRIO, Fernanda Cunha Boer et al. Correção de fenda palatina congênita em Bulldog francês. Brazilian Journal of Animal and Environmental Research, Curitiba, v. 4, n. 01, p. 142-145, 2021. Disponível em: https://brazilianjournals.com/ojs/index.php/BJAER/article/view/23409. Acesso em: 11 set. 2022.

CENTENARO, Vanessa et al. Fenda palatina em animais domésticos – revisão bibliográfica. XVI Mostra de Iniciação Científica UNICRUZ, Santa Maria, 2011. Disponível em: https://home.unicruz.edu.br/seminario/anais/anais-2011/saude/FENDA%20PALATINA%20EM%20ANIMAIS%20DOM%C3%83%E2%80%B0STICOS%20%C3%A2%E2%82%AC%E2%80%9C%20REVIS%C3%83%C6%92O%20BIBLIOGR%C3%83%C2%81FICA.pdf. Acesso em: 11 set. 2022.

CASTELETI, Aline Garcia. Fenda palatina congênita em animais de companhia: da teratogênese ao tratamento cirúrgico. 2022, p. 4-18. Monografia (UNIVERSIDADE JÚLIO DE MESQUITA FILHO) – Bacharel em Medicina Veterinária – Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Botucatu, 2022. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/236204. Acesso em: 12 set. 2022.