Melena e hematoquezia: como identificar a presença de sangue nas fezes de cães e gatos?

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Diversas afecções podem causar quadros de melena e hematoquezia em cães e gatos. Saiba como diferenciar esses sinais clínicos e agir diante dos casos!
Melena e hematoquezia são sinais comuns, inespecíficos, que podem ser associados a inúmeras condições. A presença de sangue nas fezes pode estar relacionada tanto a quadros agudos como crônicos, por isso pode representar um desafio diagnóstico na rotina da clínica de cães e gatos.
Muitos casos são leves e autolimitantes, enquanto outras condições indicam quadros mais graves exigindo maior investigação por parte do Médico-Veterinário. Neste artigo abordaremos como diferenciar esses sinais clínicos e as diversas afecções a serem investigadas pelo Médico-Veterinário a fim de instituir a conduta terapêutica mais adequada.
A importância em diferenciar melena e hematoquezia
Os sinais clínicos e a gravidade da condição de animais com melena e hematoquezia variam de acordo com a origem do sangue no trato gastrointestinal e a causa subjacente. Identificar a origem, localização do sangramento, avaliar a consistência das fezes (normais, constipação ou diarréicas) e considerar a forma como o sangue está distribuído são maneiras de determinar se a melena e hematoquezia são decorrentes de alterações no trato gástrico superior, intestino delgado ou intestino grosso. Fazer esta diferenciação é importante para a determinação da conduta adequada pelo Médico-Veterinário (Millard, 2013, Webb, 2019, Rodriguez, 2020).
Principais características em quadros de Melena
Melena é a presença de sangue digerido nas fezes e se apresenta como fezes negras cor de alcatrão (Fig 1.), devendo ser diferenciada de fezes que são intensamente verde-escuras. A presença de melena é sugestivo de lesão no trato gástrico superior ou ingestão de sangue decorrente de doença dentária, nasal e hemoptise (tosse com sangue). Quadros de melena não são indicativos de doença gastrointestinal primária, uma vez que coagulopatias também podem causar sangramento gastrointestinal e resultar em melena. Vale ressaltar, no entanto, que muito sangue deve entrar no trato gastrointestinal em um tempo relativamente curto para produzir melena, razão pela qual a maioria dos animais com hemorragia digestiva alta não apresenta melena (Willard, 2013; Boysen, 2015; Nelson & Couto, 2019).
Figura 1 – Fezes pretas com aspecto de alcatrão (i.e. melena) de um cão trombocitopênico. Quando o material está espalhado no papel, a evidente coloração vermelha mostra que na verdade é sangue (Willard, 2013).
Principais características em quadros de Hematoquezia
Hematoquezia é a presença de sangue fresco e vermelho nas fezes do animal (Fig. 2). Ao identificar a ocorrência de hematoquezia, o Médico-Veterinário deve considerar que o sangramento e lesão origina na parte inferior do intestino delgado, do cólon, reto ou ânus. Pode-se manifestar como estriações ou feixes de sangue nas fezes e geralmente indica uma lesão colônica ou retal distal ou todo o bolo fecal pode estar com sangue e incluir coágulos e/ou muco, o que sugere que o sangramento está ocorrendo mais alto no cólon. A hematoquezia aguda também pode resultar de trauma, por exemplo, passagem de corpo estranho (Willard, 2013; Boysen, 2015; Nelson & Couto, 2019).
Figura 2 – Hematoquezia – Diarreia de intestino grosso com presença de muco e sangue (Duarte, 2011).
Principais afecções relacionadas a quadros de melena e hematoquezia
As principais afecções associadas a alterações gastrointestinais relacionadas a quadros de melena e hematoquezia em gatos e cães estão listadas abaixo:
Afecções que podem estar relacionadas a quadros de melena e hematoquezia em gatos e cães | |
Fármacos
Doenças metabólicas e sistêmicas
Eventos isquêmicos
Infecções fungais
Infecções bacterianas
Infecções virais
Lesões
Alergia ou intolerância alimentar |
Infecções Parasitárias
Neoplasias – sistêmicas e gástricas
Alterações do TGI
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Adaptado a partir de Boysen, 2015; Nelson & Couto, 2019
Conduta do Médico-veterinário e orientações aos tutores
A presença de sangue nas fezes é prontamente percebida pela maioria dos tutores e, como são sinais inespecíficos que podem ser associados a inúmeras condições, é importante o Médico-Veterinário buscar a causa base do problema em vez de iniciar terapia inespecífica. A terapia médica muitas vezes pode ser ineficaz se a causa subjacente não for eliminada, causando frustração do tutor e não comprometimento com o tratamento (Boysen, 2015).
Associado ao exame clínico, uma anamnese detalhada envolvendo o histórico do paciente, com atenção para tratamentos anteriores, é importante. Exames complementares, como hemograma completo e bioquímica sérica, são indicados para identificar anemia, sinais de infecções virais, parasitismos, hemorragias, doenças sistêmicas e neoplasias. A ultrassonografia, endoscopia gástrica, colonoscopia e a biópsia podem ser indicadas na avaliação do estômago, intestino, cólon, fígado e outros órgãos, sendo ferramentas diagnósticas úteis ao procurar lesões infiltrativas e hemorrágicas. (Duarte, 2011; Boysen & McMurray, 2015; Nelson & Couto, 2019; Dossin & Jolivet, 2019).
Como abordado anteriormente, a melena e hematoquezia podem estar presentes em quadros tanto agudos como crônicos. Muitos casos são leves e autolimitantes, enquanto outras condições indicam quadros mais graves exigindo maior atenção pelo Médico-Veterinário. O fornecimento de alimentos balanceados é importante em animais com problemas do trato gastrointestinal. A terapia sintomática para problemas agudos geralmente envolve dietas de fácil digestão, enquanto a terapia específica geralmente envolve dietas hipoalergênicas, com baixo teor de gordura, dietas suplementadas com fibras ou uma combinação dessas (Duarte, 2011; Marks, 2013; Nelson & Couto, 2019).
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Referências Bibliográficas
Boysen S. R. Gastrointestinal Hemorrhage in Small Animal Critical Care Medicine. p.630–4, 2015. Disponivel em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7152172/ Acesso em: 03/02/2023.
Boysen, S. & McMurray, J. An approach to gastrointestinal hemorrhage. Veterinary Ireland Journal. 5. 438-443, 2015. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/282610493_An_approach_to_gastrointestinal_haemorrhage Acesso em:03/04/2023.
Dossin, O. & Jolivet, F. Gastrointestinal endoscopy in dogs Vet Focus, GI tract, 27.1, 2019. Disponivel em: https://vetfocus.royalcanin.com/en/scientific/gastrointestinal-endoscopy-in-dogs Acesso em: 03/02/2023.
Duarte, R. Diarréias crônicas. Informativo Vets Today, n. 3 . Royal Canin, 2011.
Marks, S. L. Diarrhea. n R. J. Washabau & M. J. Day (Eds.), Canine & feline gastroenterology, p. 99-108, 2013.
NELSON, R. W., & COUTO, C. G. Small Animal Internal Medicine, 6th ed. Elsevier – Health Sciences Division, 2019.
Rodriguez, M.D.T. Exocrine pancreatic insufficiency in dogs, Vet Focus, Exocrine Pancreas, 29.3, 2020 Disponivel em: https://vetfocus.royalcanin.com/en/scientific/exocrine-pancreatic-insufficiency-in-dogs Acesso em: 03/02/2023
Willard, M. D. Hemorrhage (Gastrointestinal). In R. J. Washabau & M. J. Day (Eds.),
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Webb, C.B. How I approach the cat with chronic diarrhea. Vet Focus, GI tract, 27.1, 2019. Disponível em: https://vetfocus.royalcanin.com/en/scientific/how-i-approach-the-cat-with-chronic-diarrhea. Acesso em: 04/02/2023