Toxoplasmose: o que é e como ocorre a infecção?

Toxoplasmose: o que é e como ocorre a infecção?

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A toxoplasmose é uma importante zoonose, caracterizada como uma das parasitoses mais difundidas no mundo. Conheça o ciclo de transmissão e as formas eficazes de evitar a contaminação pelo Toxoplasma gondii.

Toxoplasma gondii é o protozoário responsável por causar a toxoplasmose, uma zoonose de distribuição geográfica mundial capaz de causar diversos danos teciduais através da formação de cistos em musculatura cardíaca e esquelética. Este parasita também pode acometer pulmão, fígado, cérebro, retina e gerar graves complicações em gestantes, como abortos e malformações do feto.

A transmissão da toxoplasmose envolve muitos mitos em torno do gato, hospedeiro definitivo do protozoário, e cabe ao Médico-Veterinário esclarecer essas dúvidas. Confira, a seguir, os detalhes sobre o agente, suas formas de transmissão, como diagnosticá-lo e como orientar os tutores a respeito da prevenção da doença.

O que é toxoplasmose?

A toxoplasmose é uma zoonose de distribuição geográfica mundial (STELZER; 2019), que pode acometer todos os animais de sangue quente, causada pelo protozoário Toxoplasma gondii. É muito comum em países tropicais e de clima quente, uma vez que os fatores ambientais favorecem a evolução da forma infectante de seu agente etiológico, colaborando para a disseminação da doença.

Conhecendo o agente Toxoplasma gondii

Protozoário heteroxênico e zoonótico, o Toxoplasma gondii é um parasita intracelular obrigatório pertencente ao reino Protista, filo Apicomplexa e família Sarcocystidae.

Os felinos domésticos e selvagens são hospedeiros definitivos, tendo papel fundamental na fase sexuada do agente, na qual acomete as células do epitélio intestinal do animal e completa, portanto, seu ciclo de vida.

Já os animais homeotérmicos, como os seres humanos, aves e mamíferos, são considerados hospedeiros intermediários, com participação na fase assexuada do Toxoplasma gondii, que pode ocorrer simultaneamente em diferentes tecidos.

Ciclo do agente

A reprodução do Toxoplasma gondii é realizada através de duas fases: assexuada e sexuada, que ocorrem no organismo do hospedeiro definitivo (felídeo). Assim, o ciclo do parasita inclui as seguintes formas: taquizoítos, bradizoítos, merozoítos, gametócitos e oocistos.

A fase de taquizoítos representa um período agudo da toxoplasmose, ou seja, de rápida proliferação. Geralmente são encontrados no vacúolo parasitóforo de diversas células, podendo estar presentes em líquidos orgânicos, macrófagos, células hepáticas, nervosas, pulmonares e musculares.

Já os bradizoítos representam uma fase de cronicidade, de lenta multiplicação. Podem estar presentes no interior de cistos, encontrados no vacúolo parasitóforo do tecido muscular cardíaco, esquelético, nervoso e retiniano.

Os merozoítos, originados pela divisão dos bradizoítos nos enterócitos dos felinos, diferenciam-se em gametócitos, que são responsáveis pela reprodução sexuada, formando oocistos imaturos/não esporulados que são eliminados nas fezes.

Já no ambiente, ocorre o amadurecimento/esporulação dos oocistos, tornando-se infectantes. Essas formas são altamente resistentes às condições ambientais e podem sobreviver por longos períodos, dando continuidade ao ciclo de transmissão da toxoplasmose.

Nos hospedeiros intermediários (mamíferos e aves), ocorre somente a reprodução assexuada, na qual o Toxoplasma gondii multiplica-se fazendo clones de si mesmo, que se agrupam no interior dos cistos.

Afinal, qual fase do ciclo é responsável pela transmissão da doença?

As fases infectantes do ciclo do Toxoplasma gondii são os taquizoítos, bradizoítos e oocistos esporulados (ATTIAS et.al., 2020).

Taquizoítos/bradizoítos podem estar presentes em cistos teciduais e serem ingeridos pelo consumo de carne crua ou malpassada. Além disso, taquizoítos também podem ser transmitidos por meio de transfusão sanguínea, transplante de órgãos e através da placenta.

Todavia, o oocisto infectante é a fase do ciclo mais importante para a transmissão da toxoplasmose, uma vez que são altamente resistentes no meio ambiente e podem ser ingeridos através de água e alimentos contaminados.

Entendendo a transmissão de toxoplasmose para os seres humanos

Os humanos podem adquirir toxoplasmose, principalmente, a partir das seguintes vias (STELZER et. al.; 2019):

  • congênita ou placentária: pela passagem dos taquizoítos ao feto através da placenta, resultando em possíveis problemas como abortamentos ou má formação fetal, hidrocefalia, estrabismo, entre outros (ALEGRUCCI et. al.; 2021);
  • ingestão oral de oocistos infectantes: quando as fezes dos felinos infectados ficam expostas por dias no ambiente, os oocistos podem se tornar infectantes. Assim, a contaminação pode ocorrer decorrente da higienização inadequada das mãos após a limpeza da caixa de areia do gato. Ainda pode ocorrer a infecção por meio de alimentos (vegetais, frutas) ou água previamente contaminados no ambiente;
  • ingestão oral de cistos contendo bradizoítos: cistos contendo bradizoítos podem estar presentes em carnes cruas e malpassadas.

Além das causas anteriores, ainda podemos citar a transmissão da toxoplasmose através de transfusão sanguínea ou transplante de órgãos.

Qual o papel do gato no ciclo da Toxoplasmose?

Os gatos selvagens e domésticos são considerados os animais mais importantes na epidemiologia da toxoplasmose, pois são os únicos hospedeiros definitivos (DUBEY et.al., 2020). Eles são, portanto, capazes de liberar em suas fezes os oocistos que se tornarão infectantes e são ambientalmente resistentes, favorecendo a infecção.

Essa liberação de oocistos não é contínua e ocorre por um tempo limitado, liberando oocistos não esporulados que não causam a infecção de imediato. Caso o oocisto permaneça entre 48 e 72 horas no ambiente, ocorrerá o processo de amadurecimento, tornando-o esporulado, forma infectante (DUBEY, 2020). É a partir desse momento que o oocisto é potencialmente capaz de causar a toxoplasmose.

Por isso, o manejo inadequado de caixas de areia dos gatos domésticos favorece a transmissão da toxoplasmose, uma vez que as fezes expostas por período prolongado podem possibilitar a formação de oocistos infectantes de Toxoplasma gondii.

Toxoplasmose: como ocorre a transmissão para os gatos?

A transmissão da toxoplasmose para os gatos ocorre através da ingestão de água, leite cru ou não pasteurizado, contaminados com oocistos infectantes, ou ainda pela ingestão direta dessa fase do ciclo do protozoário. Além disso, os felinos também podem se infectar pela ingestão de carnes cruas ou tecidos de presas contendo cistos do Toxoplasma gondii.

ilustração que detalha como é o ciclo de vida do toxoplasma gondii em gatos
Figura 1: Ciclo de vida do Toxoplasma gondii em gatos. a) Ingestão de presas contendo cistos teciduais; b) No estômago e intestino, o cisto se rompe liberando bradizoítos; c) Bradizoítos invadem os enterócitos; d) Bradizoítos dão origem aos merozoítos; e,f) Merozoítos diferenciam-se em gametócitos; g,h) Reprodução sexuada; i) oocisto não esporulado; j) oocisto esporulado. Fonte: ATTIAS et.al., 2020.

Diagnóstico de toxoplasmose em gatos

O diagnóstico da toxoplasmose em gatos é realizado principalmente com base no teste de sorologia (IgG e IgM), em conjunto com detalhada anamnese, exame físico e exclusão de outras suspeitas.

O médico-veterinário poderá ainda solicitar outros exames complementares para a avaliação do estado de saúde geral do felino, caso julgue necessário.

A interpretação do exame sorológico leva em consideração tanto a titulação de IgG quanto de IgM, conforme explicado a seguir:

  • IgG+ e IgM-: o indivíduo testado já teve contato com o toxoplasma, mas não está doente e não corre risco de contrair a doença, pois já houve o desenvolvimento de anticorpos de memória. Neste caso, as gestantes não são capazes de transmitir a doença por via placentária ao feto;
  • IgG- e IgM+: representa a transição da fase aguda para a crônica da infecção, em que ainda haverá o desenvolvimento da produção de anticorpos IgG. Neste período, o risco de eliminação de oocistos nas fezes felinas é elevado;
  • IgG- e IgM-: é recomendado que as medidas preventivas sejam adotadas, já que o indivíduo testado nunca se infectou com o toxoplasma.

Vale ressaltar que o diagnóstico da toxoplasmose nos seres humanos segue a mesma conduta que a realizada na medicina veterinária.

Recomendações de prevenção aos tutores de gatos

Algumas medidas preventivas, incluindo cuidados tanto com os gatos quanto com humanos, podem ser recomendadas aos tutores como formas eficazes para minimizar a disseminação da toxoplasmose.

Cuidados que devem ser tomados com os felinos:

  • não alimentar o gato com carne crua ou parcialmente cozida, vísceras e outros que não tenham sido recomendados pelo médico-veterinário;
  • não permitir livre acesso do gato às ruas, para evitar a ingestão de alimentos inadequados e presas possivelmente contaminadas;
  • fazer a limpeza frequente e adequada das caixas de areia, com desinfetantes formulados para essa finalidade.

Cuidados para tutores:

  • ingerir frutas e verduras cuidadosamente lavados e higienizados;
  • não ingerir carne crua ou malpassada;
  • é recomendado o uso de luvas durante a limpeza dos locais em que haja excrementos e onde o gato defeca. Posteriormente, deve-se lavar bem as mãos;
  • a ingestão de água não filtrada não é recomendada;
  • a pessoa que possui sistema imunológico deprimido ou deseja saber se já teve contato com o Toxoplasma gondii pode verificar com seu médico a possibilidade da realização de um teste sorológico.

É extremamente importante que o médico-veterinário oriente o tutor para que jamais abandone seu gato por receio de contaminação, pois a transmissão da doença ocorre apenas por via oral, através da ingestão de alimentos, fezes e objetos contaminados. Ou seja, a higiene é a melhor forma de prevenção e os devidos cuidados são eficazes para evitar a toxoplasmose.

Conheça outras doenças de caráter zoonótico além da toxoplasmose felina

Além da toxoplasmose, existem outras doenças com potencial zoonótico de alta relevância na clínica veterinária, assim como:

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Referências bibliográficas

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