Cálculos urinários em gatos e cães e o papel da nutrição

Cálculos urinários em gatos e cães e o papel da nutrição

Links rápidos:

Diversas podem ser as causas de urolitíase nos animais, e a nutrição é uma importante aliada no manejo e na prevenção desta afecção

Urolitíases são muito frequentes em pequenos animais, podendo acometer cães e gatos. Nos felinos, as urolitíases são a segunda principal causa de Doença do Trato Urinário Inferior dos Felinos (DTUIF), um conjunto heterogêneo de afecções que acometem o trato urinário da espécie, ficando atrás apenas da cistite idiopática.

Para auxiliar o Médico-Veterinário, separamos neste artigo questões essenciais sobre as urolitíases nos pets e também quais os tratamentos e o papel da nutrição e do manejo alimentar correto para esses animais.

O que são cálculos urinários e por que eles se formam?

Os cálculos urinários, também denominados urólitos, são concreções macroscópicas formadas a partir da aglomeração de um ou mais tipos de cristais na urina.

Os urólitos podem se formar em qualquer lugar do trato urinário, mas há maior ocorrência de formação na bexiga. Os cálculos se formam quando a urina está supersaturada por grandes concentrações de minerais, que podem se precipitar secundariamente a diversos fatores predisponentes relacionados ao indivíduo, aos seus hábitos alimentares, seu comportamento, entre outros.

Existem diversos tipos de urólitos, sendo os de oxalato de cálcio e os de estruvita (fosfato de amônio magnesiano) os mais comuns em ambas as espécies. Estes serão abordados no decorrer deste artigo.

Além dos cálculos urinários, em gatos machos castrados também é comum a formação de plugs uretrais, que são precipitações desorganizadas tipicamente compostas por células de descamação, sangue e/ou células inflamatórias misturadas com grande quantidade de matriz, podendo o material cristalizado estar presente ou não.

Acredita-se que haja diferenças físicas e etiológicas entre a formação de urólitos e de plugs uretrais, porém os verdadeiros mecanismos envolvidos em sua formação ainda não foram completamente elucidados. Assim como os cálculos, os plugs também podem causar obstrução parcial ou total da uretra, e a obstrução urinária em gatos e cães é uma emergência médica que requer intervenção imediata.

Fatores predisponentes

Os cálculos urinários são formados mediante a presença de supersaturação urinária, pH favorável e presença de fatores de aglutinação, sendo a supersaturação urinária o principal fator de risco.

Há mais de 40 anos, pesquisas em medicina humana começaram a explorar formas de avaliar os parâmetros preditivos para o risco de urolitíases. Essa pesquisa resultou no desenvolvimento de uma metodologia chamada RSS (Relative Supersaturation), introduzida em 1960 pelo Dr. W.G. Robertson e, posteriormente, adotada na medicina veterinária. A mensuração do RSS prediz o potencial de formação de urólitos em um determinado ambiente urinário, baseado na concentração dos dez principais solutos envolvidos na formação do cálculo (cálcio, magnésio, sódio, potássio, amônia, fosfato, citrato, sulfato, oxalato e ácido úrico) e na mensuração do pH. A atividade produzida pela interação entre os solutos gera um índice que pode ser interpretado para avaliar o risco de desenvolvimento do cálculo.

Algumas condições predispõem o desenvolvimento de um ambiente urinário supersaturado e favorável para a calculogênese, como:

  • Baixa ingestão de água: animais que ingerem pouca água apresentam urina menos diluída e, consequentemente, acúmulo e precipitação dos cristais formadores dos cálculos. Este fator é especialmente importante em gatos, que naturalmente consomem menos água de maneira voluntária;
  • Dieta inadequada: alimentos formulados com alto teor de minerais e/ou proteínas de qualidade inferior podem aumentar a concentração de solutos na urina;
  • Obesidade: além do aumento da produção de mediadores inflamatórios que ocorre quando há acúmulo excessivo de tecido adiposo, a própria ingestão excessiva de alimento pode contribuir para a maior concentração de solutos na urina;
  • Infecções do trato urinário: a presença de bactérias em ambiente urinário alcalino pode contribuir para a aglutinação de cristais de fosfato, amônio e magnésio, formando o cálculo de estruvita;
  • Estilo de vida e comportamento: animais castrados, sedentários e que passam a maior parte do tempo em ambientes internos desenvolvem inúmeros fatores predisponentes para o desenvolvimento de cálculos urinários;
  • Sexo: machos castrados apresentam maior probabilidade de desenvolverem urolitíase ou plugs uretrais pois apresentam uretra longa e de menor calibre se comparado às fêmeas.

Outros potenciais fatores são as causas genéticas/hereditárias, cujos mecanismos ainda não foram totalmente elucidados.

Raças predispostas

De acordo com a literatura, as principais raças de gatos e cães predispostas ao desenvolvimento de urolitíase são:

Gatos

  • Persa
  • SRD (sem raça definida)
  • Himalaio
  • Birmanês
  • Exótico
  • Ragdoll

Cães

  • Schnauzer miniatura
  • Shih Tzu
  • Lhasa Apso
  • Bichón Frisé
  • Poodle Toy
  • Yorkshire Terrier
  • Cocker Spaniel Inglês
  • Dálmata
  • Bulldog

Sinais clínicos de urolitíase em cães e gatos

Os sinais clínicos da presença de cálculos podem variar de acordo com a localização, tamanho, quantidade de urólitos e grau de obstrução. Entre eles, podemos citar:

  • Hematúria;
  • Disúria;
  • Estrangúria
  • Periúria;
  • Polaquiúria;
  • Lambedura persistente na região genital;
  • Fraqueza muscular generalizada (principalmente gatos).

Diagnosticando a presença de cálculos

A anamnese e os sinais clínicos relatados pelo tutor são altamente sugestivos de obstrução causada pela presença de urólitos. O exame físico completo deve ser realizado, com especial atenção à hidratação do paciente e à palpação da vesícula urinária para avaliação de seu tamanho, formato, repleção e presença de massas intramurais ou intraluminais. Geralmente, à palpação é possível observar sinais de dor e resistência ao exame físico.

O exame de urina é útil para a avaliação de sua composição, densidade e presença de sedimentos calculogênicos. Pode ser feita a tentativa de coleta da amostra por micção espontânea, sondagem uretral ou cistocentese, método mais comum na prática clínica por ser minimamente invasivo e por evitar a contaminação da amostra. A cistocentese, no entanto, não é indicada para animais obstruídos devido ao risco de ruptura da bexiga.

O diagnóstico é confirmado pelo exame de imagem. A avaliação radiográfica é realizada para se observar tamanho, formato, posição e radiopacidade do urólito. É importante radiografar todo o trato urinário para garantir que nenhuma parte está sendo negligenciada. Alguns cálculos são radiopacos e podem ser visualizados na radiografia. Já a ultrassonografia permite a avaliação de anormalidades no conteúdo intraluminal não observadas pelo exame radiográfico (neoplasias, pólipos, coágulos e anomalias urogenitais), além de possibilitar a visualização de urólitos tanto radiopacos quanto radioluscentes.

Identificação do tipo de cálculo urinário

A vasta maioria dos cálculos urinários em gatos e cães são compostos por fosfato de amônio magnesiano, também conhecido como estruvita, ou por oxalato de cálcio. Os cálculos urinários formados nos rins (chamados de nefrólitos) são majoritariamente compostos por oxalato de cálcio.

Os aspectos epidemiológicos dos cálculos sofreram significativas mudanças nos últimos 20 anos, pois na década de 1980 os cálculos de estruvita eram muito mais frequentes em pequenos animais, mas ao longo dos anos a incidência de urólitos de oxalato de cálcio passou a ser mais expressiva.

Os urólitos podem ser enviados para análise laboratorial para que sua composição possa ser determinada. Alguns cálculos podem ser mistos ou compostos, de composição variável. Os dois principais tipos de urólitos em gatos e cães serão abordados a seguir.

Oxalato de cálcio

São urólitos formados por cálcio e ácido oxálico que se formam como resultado da interação de vários fatores de risco ambientais e metabólicos diferentes, sendo alguns primários e outros secundários. Os mecanismos de formação dos cálculos de oxalato de cálcio são complexos e sua fisiopatogenia ainda precisa de maior esclarecimento. Este tipo de urólito geralmente se forma em pH ácido e não é passível de dissolução por meio de tratamento clínico.

Estruvita

Os urólitos de estruvita são formados por magnésio, amônia e fosfato, geralmente em pH alcalino. A infecção do trato urinário com bactérias produtoras de urease constitui a principal causa deste tipo de urólito em cães. Já em gatos, geralmente ocorre sem a presença de infecção. Ocorre em fêmeas com maior frequência do que em machos. É passível de dissolução farmacológica e/ou por meio de dieta específica para promover a subsaturação.

Tratamentos para urolitíase em cães e gatos

O tratamento varia conforme a localização e quantidade de urólitos, sua composição e presença ou não de obstrução. Caso o paciente esteja obstruído, a intervenção deve ser imediata e consiste na desobstrução do canal urinário pela retirada ou dissolução do cálculo. Para isso, pode-se fazer a passagem de um cateter de pequeno calibre ou dissolução do cálculo por hidropropulsão.

A cirurgia para remoção do urólito é um procedimento invasivo que muitas vezes se faz necessária, e em casos mais graves, a uretrotomia de emergência pode ser realizada. Se houver azotemia pós-renal, deve-se instituir fluidoterapia para restauração do equilíbrio hídrico e eletrolítico.

Manejo nutricional de pacientes com cálculos urinários

A principal e mais eficaz estratégia para diminuir a saturação urinária e reduzir o risco de formação de urólitos e/ou prevenir recidivas é promover o aumento da diurese. Além de reduzir a concentração de solutos na urina, o maior volume urinário levará ao aumento da frequência de micção, o que auxilia na eliminação de cristais, materiais proteináceos e debris celulares que podem se tornar mais propensos a aglutinação na medida em que permanecem longos períodos no interior da vesícula urinária.

A forma mais simples de estimular a diurese é por meio do aumento da ingestão hídrica que pode ser promovido por duas principais estratégias:

  • Uso de alimentos úmidos: as opções de alimentos em latas ou sachês apresentam em sua fórmula alta concentração de umidade, o que, consequentemente, resulta na maior ingestão de água;
  • Estímulo à ingestão voluntária de água: os gatos demonstram especial interesse em água corrente, o que faz das fontes de água excelentes opções para estes animais. Manter algumas delas espalhadas pela casa incentiva o interesse do animal no consumo hídrico. É importante que a água esteja sempre limpa e fresca.

Além disso, é importante fazer a prescrição de dietas específicas. Os alimentos formulados para animais com predisposição a urolitíase utilizam a metodologia RSS para auxiliar na manutenção de um ambiente urinário subsaturado e desfavorável para a formação de cálculos.

As dietas coadjuvantes também estimulam o aumento da ingestão hídrica, estratégia que apresenta eficácia comprovada em literatura científica.

Leia também:

A linha URINARY da ROYAL CANIN® é o resultado de um contínuo processo de pesquisa e inovação em colaboração com Médicos-Veterinários, universidades e especialistas ao redor do mundo. Desenvolvidos com base nos mais recentes conhecimentos da nutrição clínica de gatos e cães e formulados com ingredientes rigorosamente selecionados e balanceados para serem utilizados como coadjuvantes no tratamento das urolitíases, estes alimentos auxiliam no manejo destes pacientes, oferecendo qualidade de vida, bem-estar e longevidade.

alimentos da linha Urinary

Acesse nosso portfólio atualizado da linha Nutrição Veterinária, que inclui os alimentos para o trato urinário, e acesse nossa ferramenta gratuita Calculadora para Prescrição para facilitar a prescrição nutricional coadjuvante de seus pacientes!

Referências bibliográficas

ETTINGER, J. S; FELDMAN, E.C. Textbook of veterinary internal medicine. 7ed. Elsevier Saunders, 2010.

JERICÓ, M.M.; NETO, J.P.A.; KOGIKA, M.M. Tratado de Medicina Interna de Cães e Gatos. Roca, 2015.

PIBOT, P.; BIOURGE, V.; ELLIOTT, D.A. Encyclopedia of Canine Clinical Nutrition. Royal Canin, 2010.

PIBOT, P.; BIOURGE, V.; ELLIOTT, D.A. Encyclopedia of Feline Clinical Nutrition. Royal Canin, 2010.

RICK, G.W.; CONRAD, M.L.H.; VARGAS, R.M. et al. Urolitíase em cães e gatos. Pubvet, 2017.