A arritmia sinusal com marcapasso migratório em cães deve representar um sinal de alerta?

A arritmia sinusal com marcapasso migratório em cães deve representar um sinal de alerta?

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Arritmias são anormalidades no ritmo cardíaco do animal – geralmente causadas por uma instabilidade da atividade elétrica dos músculos cardíacos – que podem afetar velocidade, força ou regularidade dos batimentos cardíacos.   

O eletrocardiograma (ECG) é o exame diagnóstico de escolha para avaliação clínica de pacientes com arritmias cardíacas, e cada componente de um traçado de ECG reflete um evento elétrico que ocorre em uma parte específica do coração. A sequência dos eventos elétricos segue caminhos anatômicos específicos dentro do coração de forma precisa e consistente. 

Antes de começar a análise das arritmias, o médico-veterinário deve entender como é um traçado normal de ECG (Figura 1), bem como o que cada onda representa nos eventos elétricos do batimento cardíaco – conforme exposto a seguir.  

Arritmia sinusal com marcapasso migratório
Figura 1 – Traçado normal ECG
  • Onda P – o nó sinoatrial (SA) inicia o processo de despolarização, à medida que o impulso elétrico se espalha; 
  • Intervalo P – R – o nó atrioventricular (AV) faz a condução do impulso dos átrios para os ventrículos, para permitir uma contração ventricular coordenada. O impulso percorre uma distância muito pequena; 
  • Onda Q – representa a despolarização do septo ventricular;  
  • Onda R – a grande massa muscular dos ventrículos é despolarizada. Isto ocorre através da rede de fibra His-Purkinje; 
  • Onda S – finalmente, as últimas regiões dos ventrículos são despolarizadas;  
  • Onda T – ocorre a repolarização dos ventrículos, pronta para o processo recomeçar. Vale citar que a morfologia da onda T pode variar de paciente para paciente, e ondas T positivas, negativas ou bifásicas podem estar presentes em cães e gatos normais. 

O que é a arritmia sinusal com marcapasso migratório? 

A arritmia sinusal com marcapasso migratório resulta da descarga irregular do nó sinusal – reflexo na onda P do ECG. Esta arritmia está associada ao ciclo respiratório. O local de formação do impulso continua sendo o nó sinusal; no entanto, a frequência da descarga varia.  

Todos os cães podem ser acometidos? 

A arritmia sinusal com marcapasso migratório é um achado normal em cães. Esta é uma ocorrência anormal em gatos no ambiente hospitalar, podendo representar algo patológico, embora pareça ser mais comum em gatos no ambiente doméstico (Sabino, 2017, Kittleson, 2023).  

Por ser de característica fisiológica, dificilmente existe um cão que não tenha experimentado arritmia sinusal com marcapasso migratório em algum momento em sua vida.  

A arritmia pode ser notada em cães com anatomia de tórax profundo, por exemplo, ou em estado de excitação. Isso porque qualquer impulso gerado fora do nó sinoatrial (marca-passo usual) causa arritmia. 

A arritmia sinusal com marcapasso migratório pode ser observada em filhotes após as 4 semanas de idade. Geralmente, a arritmia desaparece quando a frequência cardíaca excede 150 batimentos por minuto, em qualquer idade, e pode ser potencializada quando há dispneia grave devido a alterações exageradas na pressão intratorácica. 

Algumas raças parecem estar predispostas à arritmia sinusal, especialmente braquicefálicas, como Buldogue, Pug, Shih Tzu e Boxer.  

A alteração representa um risco para a saúde do pet? 

A arritmia sinusal com marcapasso migratório é um fenômeno fisiológico normal em cães. Portanto, não está associada a condições patológicas e não requer tratamento.  

A detecção da arritmia sinusal com marcapasso migratório geralmente é acidental, sendo diagnosticada pelo médico-veterinário durante a realização de ECG de rotina, principalmente pré-cirurgias eletivas como castrações ou limpeza de dentes. 

Em qual exame a arritmia sinusal com marcapasso migratório pode ser identificada? 

Apesar de a arritmia ser um quadro de alteração do ritmo cardíaco, a frequência pode estar diminuída, acelerada ou mesmo normal, dependendo do tipo de arritmia que o animal apresenta.  

O ECG é o exame que permite a diferenciação entre arritmia sinusal com marcapasso migratório e arritmias patológicas. Arritmias mais graves podem provocar diminuição do débito cardíaco, da pressão arterial e da perfusão coronariana, o que pode resultar em insuficiência cardíaca congestiva e/ou de baixo débito. 

No ECG, a arritmia sinusal com marcapasso migratório é caracterizada por ondas P mais altas durante frequências respiratórias mais altas, e ondas P menores durante frequências respiratórias mais baixas. 

Tipos de arritmias consideradas patológicas 

Complexos ectópicos são impulsos anormais originados de fora do nó sinusal. Esses impulsos geralmente criam uma irregularidade no ritmo cardíaco – consideradas arritmia patológica. 

Ritmo Sinusal com Parada Sinusal 

A arritmia de ritmo sinusal com parada sinusal é caracterizada por uma pausa no intervalo entre as duas sístoles atriais – ou seja, ciclo P – P. Quando esta pausa é superior a dois segundos, é quando esta forma de arritmia tem significância clínica. 

Ritmo Atrial 

A arritma de ritmo atrial ocorre quando o impulso elétrico possui origem no átrio, porém, em local diferente do nó sinusal. É uma situação de taquicardia atrial.  

O flutter atrial é uma manifestação do ritmo atrial e pode ser dividido em tipo 1 (flutter atrial comum) ou tipo 2 (flutter atrial incomum). 

  • flutter comum – há alteração da ativação dos átrios e isso resulta em frequências atriais muito rápidas. O ECG apresenta ritmo regular com padrão de complexos atriais bidirecionais, um padrão característico de ondas “F” ou dente de serra.  
  • flutter tipo 2 – a frequência cardíaca está muito mais alta. Esta forma também apresenta o padrão ondulado de dente de serra. O ritmo cardíaco é instável e pode ser revertido para o flutter comum ou degenerar em fibrilação atrial. 

Já a fibrilação atrial no ECG é representada por um ritmo atrial de alta frequência e desorganizado. É visível no ECG como uma linha de base com irregularidades finas e grosseiras, ou pela mistura das duas.  

Ritmo Juncional 

O ritmo juncional é caracterizado por ser um ritmo de substituição, e possui origem na junção AV ao invés do nó sinusal. No ECG, o ritmo juncional possui ondas QRS, que têm a mesma morfologia do ritmo basal com condução AV.  

Arritmia intermitente 

As arritmias intermitentes podem ser separadas em primeiro, segundo ou terceiro grau, conforme exposto a seguir. 

  • Arritmia intermitente de primeiro grau: é caracterizada por uma extrassístole (que se refere a batimentos antecipados) atrial. Na arritmia de extrassístole atrial há um batimento ectópico de origem atrial, que pode reciclar o ciclo P – P.
     
  • Arritmia intermitente de segundo grau: uma extrassístole juncional acontece, havendo batimento precoce e ectópico à junção AV. No ECG, pode ser visto de três formas: com intervalo P-R curto e onda P negativa nas derivações inferiores; com ausência de atividade atrial pregressa (onda P dentro do QRS); com onda P negativa nas derivações inferiores após o complexo QRS.
     
  • Arritmia intermitente de terceiro grau: o batimento se origina de forma precoce no ventrículo, na extrassístole ventricular, normalmente com uma pausa pós extrassistólica quando recicla o intervalo RR.  

Eixo cardíaco 

O intervalo QRS do ECG é resultado da despolarização ventricular. A sua interpretação permite inferir sobre mudança do eixo cardíaco e avaliar situações em que o coração apresenta mudança de rotação sobre seu eixo, determinando, assim, o desvio do eixo para direita ou para esquerda. 

O eixo normal do coração se localiza entre –30° e + 90°. Quando há desvio para esquerda, o eixo cardíaco apresenta variação de –30° e –90°. Já quando o desvio do eixo cardíaco está à direita, ele está entre +90° e +180°.  

Principais causas patológicas de arritmias em cães 

Nem sempre a causa primária será alteração elétrica do miocárdio, podendo ser, também, devido a um remodelamento de câmaras cardíacas, doenças virais ou neoplasias (como pancreáticas e esplênicas), entre outros. 

As arritmias em cães podem ter origem cardíaca ou não cardíaca, como veremos a seguir. Dentre as causas cardíacas de arritmias em cães, o médico-veterinário deve considerar: 

  • cardiomiopatias (ilatada, hipertrófica ou arritmogênica do ventrículo direito); 
  • alteração congênita (stenose subaórtica); 
  • doença valvar mitral degenerativa crônica; 
  • miocardite; 
  • trauma;  
  • alterações relacionadas à idade; 
  • substituição do músculo cardíaco por células inflamatórias ou cancerígenas. 

Já as causas não cardíacas de arritmias incluem:  

  • dilatação gástrica e vólvulo; 
  • pancreatite; 
  • alterações hematológicas (anemia, baixo teor de magnésio sanguíneo); 
  • doenças esplênicas, hepáticas ou do trato gastrointestinal;  
  • neoplasia cerebrais; 
  • endocrinopatias das glândulas tireoide ou adrenais; 
  • distrofia muscular; 
  • fármacos (agentes anestésicos, medicamentos);  
  • toxinas, como intoxicação por chocolate. 

Entendendo o papel da nutrição para a saúde e bem-estar dos pets 

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Referências bibliográficas 

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