Diarreia responsiva a fibras

Diarreia responsiva a fibras

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Introdução

Grande parte das alterações gastrintestinais manifesta-se como quadros de diarreia aguda ou crônica, associados ou não a vômitos ou anorexia. O manejo alimentar pode ter grande influência na recuperação intestinal e é um componente importante do tratamento para o controle de várias alterações intestinais. A instituição de um suporte nutricional específico para pacientes com alterações gastroentericas é fundamental, uma vez que o sistema gastrintestinal é essencialmente responsável pela digestão e absorção de nutrientes. Assim, objetiva-se primeiramente evitar a desnutrição do animal. Outros benefícios envolvem auxiliar na reparação do epitélio intestinal, na restauração da flora intestinal, a promover a motilidade e a função gastrintestinais, a manutenção do sistema imune e a redução da inflamação local.

Em geral, a maioria das doenças colônicas manifesta-se como um quadro de diarreia ou de constipação. A inflamação do cólon (colite) é a causa mais comum de diarreia do intestino grosso, e possui como principais causas alterações alimentares, traumáticas, parasitárias, infecciosas, imunes ou idiopática. Colites secundárias às neoplasias (linfoma, adenocarcinoma), à obstrução (intussuscepção) ou de origem funcional (síndrome do intestino irritável, diarreia por estresse) também podem ocorrer. A diarreia de intestino grosso é caracterizada por um aumento na frequência de defecação (geralmente 3x mais que o normal), com produção de pequenas quantidades de fezes geralmente com muco e, em alguns casos, hematoquezia. O animal pode apresentar tenesmo. Pacientes com diarreia responsiva a fibras apresentam quadro crônico inespecífico e o diagnóstico é feito pela ausência de alterações na avaliação clínica, por achados mínimos na colonoscopia e pela resposta completa do paciente após o uso de alimento específico (por 4 semanas).

A ALIMENTAÇÃO

Alimentos especificamente formulados para quadros gastrintestinais devem conter proteínas de alta qualidade e digestibilidade para que a digestão e assimilação dos aminoácidos sejam facilitadas, evitando a desnutrição. Além disso, uma alta digestibilidade garante menor presença de resíduos proteicos no cólon, que podem ser metabolizados pelas bactérias intestinais patogênicas causando mudanças na microbiota. Proteínas de alta digestibilidade também diminuem a estimulação do sistema imune gastrintestinal (fator importante em colites imunomediadas). A glutamina é importante para o desenvolvimento e reparação da mucosa intestinal, além de reduzir a translocação bacteriana e a inflamação. Acredita-se que o uso de proteínas de alta digestibilidade ou de pequenos polipeptídeos com alta incorporação de glutamina possa ser mais eficaz que a suplementação desta como aminoácido livre. Carboidratos de alta digestibilidade também devem ser incluídos nestes alimentos.

A utilização de um mix de fibras específico no alimento deve variar conforme a causa da alteração gastrintestinal. Atualmente, as fibras são divididas em solúveis e insolúveis, e de fermentação alta, moderada ou baixa. Portanto, o efeito obtido com a suplementação de cada tipo de fibra será distinto e a associação destes diferentes tipos trará benefícios a cada caso clínico. As fibras solúveis retêm grande volume de água formando um gel que aumenta a viscosidade do bolo fecal e diminui o trânsito gastrintestinal, tendem a ser fermentáveis e alteram a absorção de nutrientes (p. ex. psyllium). A suplementação de fibras solúveis fermentáveis (p. ex. FOS [frutooligossacarideo], polpa de beterraba, psyllium) produz ácidos graxos de cadeia curta (como o acetato, o butirato e o propionato) que geram cerca de 70% do requerimento energético do epitélio colônico. Além disso, protegem a mucosa contra lesões e acidificam o conteúdo intestinal, o que pode reduzir a proliferação e a esporulação de bactérias enteropatogênicas. O butirato é oxidado pelos colonócitos e considerado sua fonte preferida de energia. Enquanto fibras pouco fermentáveis produzem pequena quantidade de ácidos graxos de cadeia curta e são inadequadas para atender a necessidade dos colonócitos como única fonte de fibra, o excesso de fermentação pode causar flatulência e diarreia. O prebiótico MOS (mananoligossacarídeo) restringe o desenvolvimento de bactérias patogênicas pela inibição competitiva dos sítios de ligação intestinais (lectinas).

As fibras insolúveis retêm menos água, mas também possuem efeitos benéficos ao cólon como participar na formação das fezes e promover o peristaltismo intestinal (estimulado principalmente pela distensão intraluminal). A importância das fibras e de proporções adequadas de ácidos graxos ômega 6:3 na saúde do cólon já foi descrita. Além do efeito benéfico anti-inflamatório do ômega 3 já conhecido em doenças cutâneas, há evidências de que alterações na razão ômega 6:3 podem favorecer a produção dos metabólicos do ômega 3, alterando o perfil eicosanoide na mucosa intestinal.

A seleção de um alimento adequado às necessidades específicas das alterações gastrintestinais promove a recuperação da saúde gastrintestinal, além de garantir o aporte de nutrientes necessários para evitar a desnutrição. Colites responsivas a fibra e diarreias causadas por estresse possivelmente possuem correlação etiológica, e a instituição de alimento que contenha um mix específico de fibras é fundamental para um melhor manejo do paciente. O uso de proteínas e carboidratos de altíssima qualidade e digestibilidade, e de proporções adequadas de ômega 6:3 também é importante para a manutenção da saúde do cólon e do trato gastrintestinal como um todo.

 

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